quarta-feira, 5 de junho de 2013

OLHA O PÃO!

No interior do Recôncavo, protegido dos fortes ventos e ondas do Atlântico, fica a vila de São Tomé de Paripe.
No alto do mais elevado dos morros, fica a Igreja de São Tomé, construída pelos padres e índios, em 1627, e antigo cemitério ao lado.
Como as pessoas eram frequentemente enterradas enroladas em rede (costume indígena), e em covas rasas, as chuvaradas acabavam expondo os ossos. Espetáculo belo e tétrico: brancos crânios e ossos longos como fêmures, tíbias e úmeros, brilhavam ao sol.
São Tomé era antiga aldeia de índios Tupinambás, à beira mar, cujo chefe indígena Paripe, tinha a aldeia principal, na localidade atual de mesmo nome, há 6 Km de distância.
Todo o abastecimento da localidade era feita pelos saveiros, embarcação indiana, trazida para a Bahia de 1530 a 1560.
Esta embarcação chegou a um número de 2000, nas lutas de independência que culminaram com a expulsão das tropas do general Madeira de Melo, aqui e em Itaparica aquarteladas, em 2 de Julho de 1823.
Todo o comércio da cidade, recôncavo, até Cachoeira e São Felix era realizado pelos Saveiros, que “entravam” pelo Rio Paraguaçu.
Seus porões transportavam desde cimento, tijolos, areia para a construção das antigas mansões, a sacos de feijão, arroz, farinha, carne salgada (charque). Com a maré cheia, os saveiros paravam nas rampas, que é a forma mais fácil para transportar pesos (os sacos).
Lá só existe uma escadinha, muito apreciada pelos namorados.
Em São Tomé ficava a venda de Seu Cesáreo, espanhol  já idoso, que passava o dia atrás do balcão, com camisa de meia e lápis atrás da orelha.
No fundo, na parede, uma tabuleta que dizia: “ Fiado só para maiores de noventa acompanhado dos pais”.
Em antigo balcão, seu Cesáreo pesava em precisa Balança Filizola, o popular “agrado”, para as freguesas preferenciais, como minha mãe, que tinham até caderneta, onde as compras diárias eram anotadas e pagas no fim de semana. 
Toda meia noite saía a fornada de pães na padaria atrás da venda.
Comprávamos esse pão, que derretia a manteiga nele colocada e que tomávamos com café com leite. Nossa ceia, antes de dormir.
Diariamente, um garoto saía às 7 e às 5 da tarde, com enorme balaio na cabeça, vendendo o pão de Seu Cesáreo.
- Olha o pão!
E São Tomé inteiro comprava o pão de Seu Cesáreo para o café e jantar.
Certo dia o garoto mercava e ninguém queria comprar o pão para o jantar.
- Olha o pão!
E nada, o que exasperou o garoto.
- Olha o pão, porra!
Deram queixa a Seu Cesáreo, que demitiu o garoto.


                                                                                           
Salvador, 04 de Maio de 2013

Sávio Drummond






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