quarta-feira, 14 de março de 2012

AS CARTAS

Como disse Erasmo Carlos em certa canção;
 Escrevo-te estas más traçadas linhas meu  amor,
Por que a saudade veio visitar meu coração”... 

Todos nós já escrevemos e recebemos algumas cartas. Mas, só lembramos aquelas que nos davam notícia ruim. Ao contrário das recordações, que por um mecanismo de defesa, ficam apenas as boas, e as más são mandadas para o porão do inconsciente, só lembramos as cartas  que nos deram noticias ruins.
Quando o Príncipe romeno Vlade, cavaleiro da ordem do Dragão (Dracul),
ao participar das lutas nas chamadas Cruzadas (1078-1303), guerras dos europeus para libertar Jerusalém, então em poder dos mouros (árabes islâmicos), sua princesa Mina recebe uma carta, provavelmente enviada pelos inimigos, que lhe informa a morte de seu amado. Desesperada pula para a morte, afogando-se no rio que fica na base do castelo. Esse rio passou a chamar-se Rio Argesh, que em romeno quer dizer Rio Princesa. 
Alucinado Vlade Dracul, tornou-se mais sanguinário e passou a empalar vivos seus prisioneiros, assustando seus inimigos com sua ferocidade.
Vlade após a morte torna-se Drácula, personagem lendário, conhecido por alimentar-se de sangue humano.
Cartas Portuguesas enviaram as juras de amor da Sóror Mariana Alcoforado (1640 - 1723) ao seu amado o Oficial francês Noël  Bouton de Chamilly.
Uma série de cartas deixou  o genial compositor alemão Ludwig Von Beethoven (1770-1827), para as suas oito amadas. Até hoje não se sabe a qual delas denominou de “Minha Amada Imortal”. Acredita-se que foi para Theresa Malfatti, pois na época em que foi escrita, estava namorando-a.
O polonês Frédéric Chopin reuniu as cartas enviadas a sua amada Maria Vodinska, que as mandou de volta, e em 1812 fez um embrulho que intitulou Moja Bieda - Minha Desgraça.
 D. Pedro I ao receber as cartas de seu pai D. João VI que pedia que retornasse a Portugal, deu o Grito do Ipiranga . D. Pedro I tinha 22 anos, e estava, assim como toda sua comitiva, montado em mulas, que devido as suas resistências, eram utilizadas para viagens longas e não em garbosos corcéis como os quê o pintor Pedro Américo imortalizou no quadro que se encontra no museu do Ipiranga, em 7 de Setembro de 1822, tornou-se proclamador da Independência.
Segundo consta, ele e toda sua comitiva estavam de pirirí (diarréia), devido as péssimas condições de higiene das refeições feitas à beira da estrada. O filósofo tcheco Franz Kafka (1883-1924) em cartas para sua amada, deixou para a história a beleza de seu romance Cartas para Milena.
Nas cartas Napoleão Bonaparte pedia a sua 1º esposa Josefina, que não se banhasse, quando de seu regresso. Como naquela época uma carta saída da Rússia, demorava mais de 10 dias para chegar a Paris, Napoleão gostava de mulher fedorenta. Era um fetiche. 
No livro O Primo Basílio, de1878, Eça de Queiroz (1845-1900), a empregada Juliana, ao pegar uma carta de sua patroa Luísa ao seu amante Basílio, chantageia-a, porem não aproveita, pois morre no final.
A correspondência entre Rainer Maria Rilke (1875 -1926), um dos maiores poetas alemão, e um jovem, seu admirador, que lhe pergunta ao enviar-lhe suas poesias, se deveria dedicar-se a elas ou a carreira militar, como queriam seus pais.  Rainer lhe respondeu; “Na mais anódina das horas, faça essa pergunta a você mesmo. Se tiveres como resposta um rotundo não, a ela se entregue”, originou o livro Cartas a um Jovem Poeta. 
As cartas levam não somente palavras. Elas carregam emoções.
                                                                                                                                                                                                                                                                   “E, para terminar amor, assinarei, do sempre, sempre teu “...                                                                                                            

 Salvador, 12 de Outubro de 2011.                                                                                
 Sávio Drummond.    

quarta-feira, 7 de março de 2012

HISTÓRIA DE AMOR

Quando adolescente tive a oportunidade de conhecer um casarão do Século XIX que ficava na Ladeira de São Bento. Sua arquitetura, vitrais coloridos e um tabuado de madeira de lei em duas cores, testemunhavam uma época de opulência e riqueza.
Velhos jornais  amarelados,  noticiavam  a revolta da Armada (1893 - 1894), movimento dos marinheiros contra o governo do Marechal Floriano Peixoto, a revolta da Chibata, liderada pelo marinheiro negro João Candido, em 22 a 27 de Novembro de 1910, que pos fim aos castigos corporais (25 chibatadas) aos marujos infratores, e a Guerra de Canudos (1893 - 1895), em matéria escrita pelo Jornalista Euclides da Cunha.
Antigas revistas como O Careta e O Malho, traziam as caricaturas nas “charges”, que criticavam a campanha da vacina obrigatória de 1904, onde agentes de saúde invadiam as residências para vacinarem as pessoas à contra a varíola, chefiada pelo recém formado no Instituto Pasteur de Paris, Dr.Oswaldo Cruz, a mando do Presidente Rodrigues Alves. 
De todo embolorado material, guardei vários Cartões Postais que registraram a correspondência entre a jovem Marialinda, residente no casarão e um jovem que morava em Paris. A correspondência feita com postais em preto e branco, mostrava a qualidade das fotos da época, pois se fossem coloridas, certamente não teriam resistido ao tempo. Nenhum postal dela pude guardar, pois a correspondência era a que a jovem tinha recebido. 
Um deles dizia: 
-“Senhorita Marialinda.
Ontem me senti envergonhado por  ser brasileiro. 
Um rapaz que conheci em um café,  passou a tratar-me com desdém ao saber que sou brasileiro.
Os franceses são muito arrogantes. Ao perceber meu sotaque passou a falar rápido e cheio de expressões idiomáticas, tudo para dificultar meu entendimento” ... 
-“Senhorita Marialinda.
O inverno daqui está muito rigoroso. Quantas saudades do Sol e praias de Salvador. Alguns franceses, no verão tomam banho no Sena. Eu não me arrisco”...
-“Senhorita Marialinda.
Recentemente comprovei que a história que francês não gosta de banho é verdadeira. Pelo menos durante o inverno. Entrar em elevador no inverno é torturante. A mistura de odores de perfumes caros, com o de casaco de peles e suor, é nauseante”... 
- “Marialinda querida.
Nos Salões Parisienses só se dança o Maxixe. Ritmo brasileiro que a polícia proibiu nos bailes públicos e nos entrudos, aí da terrinha.
Moça de família não pode dançar o Maxixe. Aqui em Paris, um baiano chamado Duque, está ganhando rios de dinheiro ao dançar, a mistura do ritmo sensual africano Landu, com a Polca. Copiei do jornal a descrição do Jornalista João Chagas, feita em 1897 sobre o Maxixe:
-“Os pares enlaçam-se pelas pernas e pelos braços, apóiam-se quanto possível pelas testas num gracioso movimento de marrar, e assim unidos, dão a um tempo três passos para diante e três passos para trás, com lentidão. Súbito circunvoluteiam, e vão avançando e retrocedendo, como a quererem possuir-se”. -“Senhorita  Marialinda.
Na semana passada, em 19 de Outubro de 1901, os jornais noticiaram que um mineirinho baixinho e  bigodudo, chamado Alberto Santos Dumont, voou em um dirigível, deu uma volta na Torre Eiffel  e ganhou  o Prêmio Deutsche e uma aposta que tinha feito”. .. 
-“Senhorita Marialinda.
Senti-me orgulhoso em ser brasileiro.
Ontem, em 23 de Outubro de 1906, o mesmo mineirinho que vem encantando a todos, realizou o sonho de Ícaro, e em uma engenhoca de bambu e seda Chinesa, levantou vôo do campo de Bagatelle.
Conseguimos imitar os pássaros”...
-“Senhorita Marialinda. 
Recebi sua carta dizendo do seu casamento no mês que vem.
A distância e sua família venceram, mas quero que saibas que nenhum homem lhe amará tanto quanto eu te amei.
Por favor seja feliz!”

Algumas letras neste postal, estavam manchadas. Talvez, lágrimas desbotaram a tinta...                 


Salvador, 13 de Fevereiro de 2012.
Sávio Drummond.