quarta-feira, 30 de maio de 2012

A ENFERNEIRA


Tive uma Técnica de Enfermagem, como auxiliar em um  Posto de Urgências em que trabalhei.
Muito religiosa, só andava dizendo; -“Sangue de Cristo tem poder!” 
Gostava muito de música e com um “ouvido apurado”, estava aprendendo auto - didaticamente, através de um método, a tocar flauta doce.
Depois do almoço, eu querendo descansar e a “Enferneira” tocando a flautinha: 
-Fuim, Fuem...Fuim, Fuem.
Quem já passou por “tortura” semelhante, sabe que só existe uma coisa pior que flauta mal tocada. Violino mal tocado! 
Enquanto outro colega, “guarnecia o forte”, eu procurava, buscava, necessitava descansar.
Mas a flautinha impiedosa continuava seu “berreiro” cruel:
-Fuim, Fuem...Fuim, Fuem ... 
Como ela era Evangélica, resolvi usar de argumentos Bíblicos para fazê-la parar:
- Irmã, você conhece aquela passagem do Novo Testamento que fala de Jesus no Monte das Oliveiras, e Zaqueu, o cobrador de impostos?
Mostrando que a “isca” funcionara:
- Conheço, mas em se tratando do Senhor, qual se refere?
- Madrugada, e Jesus, sentado em uma pedra, meditava.   Seus discípulos sentados no chão aguardam. O tempo passa e eles começam a adormecer. Para espantar o sono, Zaqueu, um dos seus apóstolos, começa a tocar uma flautinha, assim como você. barulho chega até Jesus, que interroga:
- Quem toca este instrumento? 
Zaqueu percebendo que estava sendo inconveniente, prosta-se ante seus pés e exclama:
- Senhor desculpa-me. Dizei uma só palavra e jogarei às chamas, este maldito instrumento.
Jesus, emocionado com a atitude do baixinho Zaqueu, levanta-o e segurando em seus ombros, diz:
- Zaqueu, filho meu, humildade como a sua, meu olho nunca viu. Mas vá tocar mal esta flauta, na “puta que te pariu”!
De outra feita, de madrugada, estava no quarto, quando a “enferneira”, entra esbaforida, gritando;
-Doutor, um homem ensanguentado, como uma faca na mão, entrou no posto gritando que quer sangue, quero sangue! Nisso o homem, acompanhando-a entra também no quarto:- Eu quero sangue, preciso de sangue!  
A “enferneira” tranca-se no banheiro, gritando; -“Sangue de Cristo tem poder. Valha-me Nosso Senhor Jesus Cristo. Pelas sete chagas de Cristo, acudam-me”! 
Calmamente procuro atender ao homem, enquanto “estudo” por onde fugir.
O homem ensanguentado, na verdade fora ferido, em uma briga de faca, e pedia que lhe dessem sangue, pois achava que precisava de uma transfusão... 
Soube há pouco que a “Enferneira”, aposentou-se, estudou e hoje toca harpa e está ganhando muito bem como professora de música.
                                                                                                           Salvador, Fevereiro de 2012.
Sávio Drummond.

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