quarta-feira, 19 de outubro de 2011

INOCÊNCIA

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                      Marianinha era inocente, como só as crianças hão de ser. Sim, pois basta arredondar-se- lhes as formas ou apontar-se lhes o buço, perdem-na como à noite as estrelas, aos primeiros sinais da manhã.
Pouco mais de dez anos e os hormônios a imprimir-lhe mudanças no corpo infantil, sem preparar-lha a cabeça. 
Em casa começaram as proibições: 
- Vai vestir a blusa menina. Onde já se viu uma moça andando pelada pela casa?
- Marianinha que modos são esses? Você já é uma mocinha!
Menina, moça, mocinha... Afinal se nem os adultos se decidiam sobre o que ela era.
E por que tanta preocupação, se até pouco tempo ninguém ligava?
Com os amiguinhos da mesma idade, volta e meia tinha que responder perguntas e mostrar as transformações que seu corpo sofria. Encarava com naturalidade a curiosidade dos coleguinhas, pois, quem mais que ela, a surpreender-se com essas mudanças?
Um de seus colegas ao chegar das férias, espanta-se com tão grande diferença, e exige seus direitos de amigo predileto:
- Você vai ter que me mostrar. 
- Mostrar o quê? 
- Os peitinhos. Você mostrou a turma toda, menos eu. 
- Mostrei, mas agora só mostro as meninas. 
- Por que só as meninas?
- Por que os meninos são abusados.
- Mas você mostrou ao Cacau, ao Binho e ao Bujão. Só eu seu melhor amigo, não vi.
E foram tanto os argumentos que Marianinha resolveu satisfazer o desejo do amiguinho injustiçado.
Tá certo Tato, eu te mostro. Mas não vale fazer fonfom!



 Salvador, 20 de Agosto de  1994.
Sávio Drummond.

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